Gestão do Conhecimento

Compartilhamento do Conhecimento
Motivado por excelentes "provocações" feitas na lista de Gestão do Conhecimento que participo (competitive-knowledge@yahoogroups.com), estive pensando sobre as várias posturas e atitudes humanas úteis e desejáveis em GC (como o compartilhamento de conhecimento, por exemplo), tentando avaliar como as pessoas enxergam cada um destes comportamentos apreciados pela gestão do conhecimento.

Compromisso com a aprendizagem, coerência nas atitudes, saber contratar, reter, manter e demitir, saber indicar, delegar responsabilidades, promover, alocar, saber onde buscar e procurar informações, gostar de aprender, curiosidade, julgar e interpretar, imaginar, especular, criar e inovar, contar histórias, gostar de ensinar e aprender, dar idéias, informar, ler, realizar, fazer, construir, incentivar, apoiar, motivar, imitar, radicalizar, testar, experimentar, provar, observar, falar e conversar, conhecer e reconhecer são outros importantes exemplos.

Por que então as discussões em torno da GC e das posturas admiradas se concentram principalmente em torno do compartilhamento de conhecimento dentro da empresa? Sinceramente, ando meio cansado de ouvir, na tentativa de demonstrar e justificar a importância das trocas de conhecimento entre as pessoas, aquela história da nota de um dólar que uma pessoa empresta a outra e assim uma delas fica mais pobre um dólar, enquanto a outra fica um dólar mais rica e que isso não acontece com o conhecimento quando ele é doado a outro colega.

Também ando enfadado de tanto ouvir relatos de casos, que enfatizam os sucessos das trocas de conhecimento em detrimento do egoísmo intelectual. Neles, os autores se esforçam para justificar o compartilhamento do conhecimento, como se isso fosse a única coisa a ser feita ou como a coisa mais importante em gestão do conhecimento. Isso não é verdade. Compartilhar conhecimentos internamente continua sendo importante, mas certamente está longe de ser a coisa mais importante.

Não pretendo passar a idéia que o compartilhamento do conhecimento deixe de ser interessante para empresa. Não é isso. Com maior intensidade ele continuará sendo realizado. Não há como fugir disso, pois qualquer profissional que queira permanecer no mercado terá de abrir-se a oportunidades de troca. Esta é uma condição sine qua non para a empregabilidade.

Pretendo chamar sua atenção para o fato que muitas questões e relutâncias surgem quando discutimos o compartilhamento do conhecimento frente ao medo das pessoas de compartilhar o que sabem e assim perderem o status ou a posição na empresa. Se conhecimento é poder, por que alguém compartilharia o que sabe? Se o conhecimento é tão importante para empresa, não seria também tão importante para as pessoas?

Muitas pessoas já deixaram de apoiar iniciativas de GC por conta de discussões e justificativas em torno do compartilhamento do conhecimento, e isso é como discutir as diferenças entre dado, informação e conhecimento e deixar de fazer gestão do conhecimento por não se ter chegado a uma conclusão a respeito das diferenças entre eles. Observe como às vezes é inútil. Gastamos tanto tempo tentando explicar ou justificar essas diferenças e no mundo real da GC, teremos que desenvolver grande habilidade e aprender a lidar com todos eles (dados, informação e conhecimento) ao mesmo tempo.

Em prejuízo da gestão do conhecimento, muitos acabam deixando de acreditar no potencial da GC por conta de discussões polêmicas deste tipo, que pouco valor agregam ao contexto do dia a dia. Desprezar a gestão do conhecimento por conta das dificuldades do compartilhamento do conhecimento, frente ao gigantismo do processo de GC, de maneira pouco exagerada é o mesmo que deixar de produzir um carro por que não se encontrou uma solução para fixação do radiador.

Embora importante, a postura do compartilhamento não é única necessária à gestão do conhecimento. Tratada como única preocupação, transforma-se em risco, ameaçando a existência de programas de gestão do conhecimento completos e cegando muitas pessoas para oportunidades e iniciativas de GC.

Será que compartilhar tudo o que as pessoas sabem é suficientemente competitivo para a empresa? Será que o compartilhamento do conhecimento justificaria todo um programa de GC na empresa? Presumo que não. Muito mais que compartilhar, as empresas, os programas de GC e as pessoas devem se focar também na aprendizagem, existindo muitas fontes de aprendizado que não podemos desprezar. Quantos por cento representa o compartilhamento do conhecimento no contexto total das posturas desejáveis na GC? Compartilhar conhecimentos, comparado com a grande lista de atitudes desejáveis e amigas do conhecimento representa apenas a ponta do iceberg.

Será que se nos preocuparmos demasiadamente com o compartilhamento do conhecimento e suas nuances, não aumentamos o nosso risco de desviar a atenção de coisas igualmente importantes e menos polêmicas? Se nos concentrarmos no compartilhamento do conhecimento não estaremos enfatizando muito mais o conhecimento existente e muito menos o conhecimento a ser produzido e adquirido? Qual seriam os prejuízos reais se superestimarmos o compartilhamento do conhecimento em detrimento de outros comportamentos favoráveis à GC? A empresa que superestima o compartilhamento do conhecimento em detrimentos de outras posturas, não estaria propensa a ver todas as suas iniciativas focadas e hiper dependentes também do compartilhamento do conhecimento? Além disso, o compartilhamento do conhecimento não poderia estar embutido dentro de outras iniciativas, preservar seu potencial e produzir seus efeitos sem que as pessoas o percebessem explicitamente?

Outro aspecto interessante em relação a isso, é que se todos na empresa se sentissem confortáveis a compartilhar conhecimento e todos se dedicassem somente a esse compartilhamento, a empresa entraria num estado de hibernação intelectual total. Ao concentrar-se apenas no compartilhamento do conhecimento, uma empresa simplesmente igualaria o conhecimento de todos e não iria garantir vantagem competitiva alguma. O interesse da empresa do conhecimento não é esse. Não é todos saberem as mesmas coisas. É sim todos saberem as coisas certas.

No exemplo acima, a empresa em pouco tempo se tornaria burra. Mais importante que compartilhar é aprender. E aprender envolve aprender com o mercado, com os clientes, com os concorrentes, com os parceiros, com os processos, com os fornecedores, com os centros de excelência, com os erros e acertos, com os institutos de pesquisa, com os benchmarkings internos e externos e muito mais. Além disso, o aprender não despreza as forças externas, uma vez que grande parte do conhecimento necessário à competitividade está fora da empresa.

Compartilhar sem aprender é o mesmo que decretar a morte. Entre tantos outros comportamentos admiráveis, o ideal seria que todos compartilhassem e aprendessem ao mesmo tempo. Contudo, é terrivelmente pior a uma empresa, quando seus funcionários compartilham e deixam de aprender, do que quando eles deixam de compartilhar, mas continuam aprendendo. Este é o sentido deste artigo.

Compartilhar a vacina encontrada para combater um determinado vírus, deixando de aprender mais sobre ele, significa decretar a morte de todos infectados pelo vírus logo após sua primeira mutação. Tribos inteiras já extintas compartilharam tudo o que sabiam entre seus membros e isso não as livrou do extermínio. Mesmo compartilhando, se tornaram incapazes de aprender e se preparar contra as ameaças, que foram mais tarde, as causas de sua ruína.

Por fatores como estes, prefiro enfatizar o aprendizado e utilizar a expressão colaboração. Incrível, mas é muito diferente de compartilhar conhecimentos. Parece que o termo compartilhar conhecimento vem carregado de pré-conceitos implícitos e negativos ao sucesso da GC. Nos programas de GC compartilhar o conhecimento deve ter o peso que merece. Nem mais, nem menos.

Se você perguntar na maioria das empresas: Quem vai compartilhar conhecimentos com fulano? Possivelmente muitos vão concentrar-se em outras coisas e encontrar mil desculpas para fugir a essa tarefa. No entanto, quando perguntamos às pessoas, se alguém poderia ensinar fulano, sempre aparecem mais pessoas do que precisamos.

Aprender, compartilhar responsabilidades de maneira inteligente, delegar desafios com base nas competências, estruturar e organizar as entregas de conhecimento aos clientes, elaborar estratégias mercadológicas para o conhecimento, todos exigem certa dose de eficácia na CG e tal como o compartilhamento do conhecimento, continuam muito importantes a gestão do conhecimento.

Também difíceis de serem alcançados, infelizmente estão quase completamente ausentes das discussões inflamadas.

Autor: Saulo Porfírio Figueiredo
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